Recentemente, o anúncio de um acordo da farmacêutica norte-americana Gilead Sciences trouxe esperança para o combate ao HIV, especialmente nos países em desenvolvimento. A Gilead firmou parcerias com seis fabricantes de medicamentos genéricos localizados na Ásia e no norte da África para a produção do lenacapavir, um fármaco inovador que promete transformar a prevenção e o tratamento do HIV. No entanto, a exclusão de países de renda média, como o Brasil, deste acordo gerou discussões importantes sobre a equidade no acesso a tratamentos de ponta.
O lenacapavir é uma injeção semestral que oferece uma proteção quase total contra o HIV, sendo aclamado por especialistas como uma solução revolucionária. Segundo a Gilead, o medicamento estará disponível em versões genéricas em até 120 países de baixa e média renda, majoritariamente na África Subsaariana, até o final de 2027. Esse plano visa ampliar o acesso a regiões com alta taxa de novas infecções e onde a luta contra a doença enfrenta desafios estruturais. O Unaids, programa da ONU para o combate ao HIV/Aids, elogiou a decisão da Gilead, destacando o potencial transformador do medicamento em comunidades vulneráveis.
Apesar do entusiasmo, a exclusão de países de renda média-alta, onde ocorrem cerca de 20% das novas infecções por HIV, tem levantado críticas. O Brasil, por exemplo, não será contemplado no licenciamento inicial. Essa decisão é motivo de preocupação, uma vez que países dessa categoria enfrentam desafios igualmente complexos no controle da epidemia. De acordo com Winnie Byanyima, diretora executiva do Unaids, 41% das novas infecções ocorrem em países de renda média-alta, e a exclusão desses territórios pode comprometer o impacto do lenacapavir na redução global de novas infecções.
Outra preocupação levantada diz respeito ao custo do tratamento. Embora a Gilead tenha garantido que os acordos com os fabricantes genéricos são isentos de royalties, especialistas pedem maior transparência em relação aos preços finais do medicamento, principalmente para garantir que ele seja acessível a quem mais precisa. Estudos apontam que é possível fabricar e comercializar o lenacapavir por valores entre US$ 40 e US$ 100 por paciente ao ano. No entanto, a Gilead ainda não divulgou um valor específico para a versão genérica.
O licenciamento também abrange o uso do lenacapavir no tratamento de adultos com HIV resistente a múltiplos medicamentos, aumentando as opções terapêuticas para pacientes em estágios avançados da doença. A inclusão desse uso é vista como um avanço importante, embora especialistas defendam a remoção de restrições para que o medicamento possa ser utilizado amplamente em pacientes que estão iniciando o tratamento.
Apesar das críticas, o acordo reflete uma estratégia da Gilead para aumentar o acesso global a tratamentos inovadores. A empresa já possui um histórico de licenciamento de versões genéricas de seus medicamentos contra o HIV e hepatites, permitindo a comercialização a custos reduzidos em várias partes do mundo. A expectativa é que a aprovação regulatória do lenacapavir aconteça até o final de 2024, e a Gilead já anunciou que priorizará a aprovação em 18 países que concentram a maior parte dos casos de HIV.